Nosso corpo não é público.
Se fosse dado o direito de escolhas à qualquer mulher brasileira,
certamente, uma delas seria poder andar na rua tranquila, sem assédios, sem
palavras inoportunas recebidas de homens anônimos e aleatórios, que autorizados
pelo machismo e misoginia, sentem-se totalmente possuidores do direito de
importunar desconhecidas transeuntes.
A brasileira naturalizou os assédios constantes. Não estarei aqui exagerando em nenhum ponto se afirmar que todas, exatamente todas as mulheres que vivem neste país têm alguma experiência com assédios masculinos em suas jornadas.
É possível que haja uma ou outra que não saiba descrever como
assédio aquelas importunações masculinas nas ruas. Porém, o fato existe, é
constante, é diário.
A sacralização do corpo feminino é um estorvo para mulheres
que têm seus corpos constantemente controlados, seja pela religião, pelo
Estado, pela sociedade em geral que ditam regras morais a seguir mediante
punição, sejam elas físicas ou simbólicas para aquelas que ousadamente tentem
reivindicar a autonomia de seu próprio corpo.
O Brasil é país conservador movido por dogmas religiosos e
cujo Estado e sociedade controlam e oprimem os corpos femininos. Reflexo disso
são os números estarrecedores de violências de gênero que testemunhamos
diariamente nos noticiários, cientes de que o que não é publicizado engorda as
subnotificações e nem saberemos ao certo quantas mulheres sofrem todo tipo de
violências diariamente, em números absolutos. Mas sabemos que são muitas,
milhares, milhões...
Entretanto, a solução é ainda resistir às imposições,
inclusive veladas, que nos dão a sensação falsa de liberdade frente a países
que carregam fama de conservadores e cerceadores da liberdade feminina.
É urgente desconstruir o sistema opressor que está posto e
que finalmente a emancipação feminina possa ser uma realidade e não simulacro
da falsa liberdade sexual e de escolhas amplamente difundidas no Brasil, e que
ilude e acomodam muitas de nós em uma realidade que reflete a ausência de
liberdade de dispor sobre o próprio corpo
Nossos shorts não são convites para assédio. Nossas leggings
não dão direito para sermos importunadas. É vergonhoso e desesperador precisar
repetir o óbvio, o trivial, o básico para seres humanos em pleno 2020.
Nosso corpo não é público. De roupa curta ou comprida, todas
as mulheres merecem o direito de ir e vir, em paz.
Gueu Nogueira - Geocomunicóloga soteropolitana: Misturo Geografia com Comunicação, bisbilhoto o cotidiano e escrevinho umas notas.
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